Aprovação da reforma da Previdência traz esperanças de um ambiente de negócios melhor, mas agir com cautela ainda é a decisão mais sensata.
Enfim, a novela da reforma da previdência chega na reta final. Foram capítulos emocionantes até aqui, e ainda que as pessoas já soubessem como seria final disso tudo, muita gente se regozijou com o fato da reforma ter sido aprovada em segundo turno no Senado Federal.
Momento oportuno para a aprovação da reforma por causa do fantasma da crise internacional, do desgaste de governos liberais na América Latina e, como se não bastasse, ressurge das cinzas um dos piores desgastes da família Bolsonaro, o assessor parlamentar Fabrício Queiroz.
Reforma da Previdência foi só o começo
Tal como havíamos falado neste espaço, a aprovação da reforma da previdência traz um novo ânimo ao governo federal e, consequentemente, ao mercado financeiro brasileiro.
Resultado disso pôde ser visto no principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) que alcançou pela primeira vez na história os 107 mil pontos.
É claro que parte dessa euforia no mercado financeiro está condicionada a outros fatores que não estão diretamente ligados à aprovação da reforma da previdência. Exemplo disso foi o desempenho da Petrobras, que diante do encaminhamento da cessão onerosa para exploração do pré-sal, subiu forte na semana.
O fato é que a aprovação da reforma ajudou na condução de uma semana marcada pela valorização do Real frente ao Dólar americano.
Na quinta-feira (24) o Dólar chegou a ser cotado abaixo dos R$ 4,00 pela primeira vez em mais de dois meses e, apesar de ter fechado o dia com ligeira alta, houve uma reversão na tendência de alta vista nas últimas semanas.
Novas reformas a caminho?
O mercado também tem se entusiasmado com a possibilidade de mais reformas importantes até o final do ano, entre as quais destacam-se a administrativa e a tributária.
Segundo o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, a reforma administrativa tem potencial de ser tão grande quanto a reforma da previdência.
Há um ímpeto muito grande em realizar mais reformas da estatura da reforma da previdência e esse é um canal de extrema influência na cotação do Dólar e no mercado financeiro.
A reforma tributária também está no radar do mercado financeiro, mas pelas propostas já apresentadas não há muito o que comemorar, por enquanto.
O fato é que de reforma a tributária não tem muita coisa. Os projetos apresentados não atacam problemas relevantes como, por exemplo a regressividade da carga tributária, tampouco se propõe a colocar para andar pontos que já deveriam estar em pleno funcionamento como, por exemplo, o imposto sobre grandes fortunas (IGF).
Temos mudanças políticas e econômicas relevantes em curso e é bom aproveitar essa oportunidade doméstica porque os desdobramentos da desaceleração da economia global imporão grandes desafios ao Brasil nos próximos meses.
Momento é de atenção na economia mundial
Esses desdobramentos da desaceleração da atividade econômica mundial já podem ser vistos nos resultados do setor externo aqui no Brasil e no mundo todo.
Para ver a degradação da situação na Europa basta ver o comportamento da indústria alemã nos últimos meses. Nos Estados Unidos, dados ambíguos sobre produção industrial e consumo no comércio varejista indicam que algo pode não estar muito bom. Já na China, para citar apenas três dos quatro maiores países do mundo, o crescimento do produto está no limite da margem inferior estabelecida pelo governo para este ano.
Aqui no Brasil, um olhar mais atento percebe a queda de 7,5% das exportações totais entre janeiro e a terceira semana do mês de outubro na comparação com igual período do ano passado, além da redução de aproximadamente 1% das importações na mesma base de comparação.
O saldo comercial trimestral médio atingiu na última semana de setembro o menor patamar desde dezembro de 2015. Na comparação com igual período do ano passado, o saldo médio trimestral deste ano é 45% inferior, muito abaixo da queda média de preços das commodities exportadas pelo Brasil (-9,5%).
Esvaziamento das reservas internacionais chama a atenção
Outro fator que tem chamado a atenção é o rápido esvaziamento das reservas internacionais. No dia 23 de agosto deste ano o Brasil tinha em reservas internacionais aproximadamente USD 389,5 bilhões, ante USD 371,4 bilhões ao final do dia 23 de outubro.
Se não é necessariamente preocupante, chama a atenção para o fato da redução de quase USD 20 bilhões do montante das reservas internacionais em dois meses.
Como se não bastassem os problemas de ordem econômica o Brasil está envolto aos problemas políticos vividos pelos seus principais pares na América Latina.
Argentina, Bolívia, Chile, Equador e Peru, passam neste momento por delicados conflitos sociais que podem ser potencialmente perigosos para o Brasil.
Perspectivas
A aprovação da reforma da previdência parece ter dado o ímpeto que faltava ao Congresso Nacional para a aprovação de outras reformas importantes. Exemplo disso podem ser as declarações de membros do Parlamento brasileira acerca da aprovação das reformas administrativa e da previdência
Esse cenário benigno de relativa coesão entre o Ministro da Economia, Paulo Guedes, e o Congresso pode trazer algum alívio para a cotação do Dólar.
No entanto, problemas antigos continuam a rondar o presidente. Para além da situação econômica interna temos a desaceleração das maiores economias do mundo e a queima rápida das reservas internacionais
O movimento do câmbio torna-se-a mais errático a partir daqui, respondendo com valorização do Real aos desdobramentos da tramitação das próximas reformas e com desvalorização aos conflitos sociais da América Latina e econômicos dos países desenvolvidos.
Veremos!
André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.